O vosso artigo sobre Théophile Gautier, meu senhor, é uma dessas páginas que provocam a reflexão. Mérito raro, fazer pensar; dom unicamente dos eleitos. Não vos enganais ao prever alguma dissidência entre nós. Entendo toda a vossa filosofia (pois como todo o poeta, tendes filosofia); faço mais do que compreendê-la, admito-a; mas conservo a minha. Nunca disse a Arte pela Arte; disse sempre: a Arte pelo progresso. No fundo é a mesma coisa e vosso espírito é por demais penetrante para deixar de percebê-lo. Avante! É a frase do Progresso; é também o grito da Arte. Todo o verbo da Poesia aí está. Ite.
Que fazeis ao escrever estes versos surpreendentes: " Os sete anciãos" e "As velhinhas" que me dedicais e pelos quais vos agradeço. Que fazeis? Caminhais. Avançais. Dotais o céu da arte de não sei que raio macabro. Criais um arrepio novo.
A Arte não é perfectível, creio ter sido um dos primeiros a dizê-lo, portanto, sei disso; ninguém ultrapassará Esquilo, ninguém ultrapassará Fídias, mas podemos igualá-los; e, para isso, é preciso deslocar o horizonte da Arte; ir mais alto, ir mais longe, caminhar. O poeta não pode ir sozinho, é preciso que o homem se desloque também. Os passos da Humanidade são, portanto, os próprios passos da Arte. Portanto, glória ao Progresso.
É pelo progresso que sofro neste momento e que estou pronto para morrer. (De uma carta de Vitor Hugo a Baudelaire)
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O primeiro excerto em negrito parece de certo modo correto. De outro ângulo, na arte sempre sobra algo inacabado, portanto não corrijo Ésquilo ou Fídias, contudo estes, se eternos fossem, provavelmente estariam se autocorrigindo constantemente, por se crerem longe da perfeição. Portanto, a arte não é perfectível não porque ela seja perfeita, mas isto sim, por sempre estar a lhe faltar algo com que se lhe dê um fim, ou seja, pela sua incompletude.
O segundo excerto em negrito me pareceria um tanto melhor se pudéssemos invertê-lo, dizendo: os passos da arte são, portanto, os próprios passos da humanidade. Ordem que nos obriga a descrer na função do artista desbravador, nos insere na realidade de um artista que anda, como de resto a humanidade, em círculos, tateando o desconhecido e firmando-se num terreno escorregadiço sobre o abismo, que nos conduz a este interminável confronto com a morte. Morte que, como o lobo na floresta, nos aponta e nos tange a trilhar este caminho sem fim.
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