do tratado da reforma da inteligência

"tudo o que acontece na vida ordinária é vão e fútil ....As coisas que mais frequentemente ocorrem na vida, estimadas como o supremo bem pelos homens, a julgar pelo que eles praticam, reduzem-se, efetivamente, a estas três, a saber, a riqueza, as honras e o prazer dos sentidos. Com estas três coisas a mente se distrai de tal maneira que muito pouco pode cogitar de qualquer outro bem. ... Assim, parecia claro que todos esses males provinham disto – que toda felicidade ou infelicidade reside numa só coisa, a saber, na qualidade do objeto ao qual nos prendemos pelo amor. De fato, nunca surgem disputas por coisas que não se ama; nem há qualquer tristeza se as perdemos; nem inveja, se outros a possuem;nenhum ódio e, para dizer tudo numa palavra, nenhuma pertubação da alma (animus). Ao contrário, tudo isso acontece quando amamos coisas que podem perecer, como são aquelas que acabamos de falar. Mas o amor das coisas eternas e infinitas nutre a alma de puro gozo, isento de qualquer tristeza..."

quarta-feira, 22 de setembro de 2010


De hoje em diante, caminho sozinha. A incompetência das pernas ainda parece maior do que a vontade de prosseguir, sem parceria, nessa empreitada, mas quero muito tentar. Confesso que a contribuição do Jaime fará muita falta, já que ele é quem vinha tocando quase tudo sozinho por aqui. Seguirei no mesmo rumo, entretanto. A cara do blog já mudou, mas só um pouco e, não estranhem se isso se tornar habitual, pois adoro mudanças. Faz parte de minha essência geminiana. Para conhecimento de todos, acabo de lançar meu segundo livro, pela editora Movimento, chamado Córrego de Amarras, lançamento esse que se deu no dia 10 de setembro passado, na livraria Palavraria, noite muito feliz para mim. Então, aí vai postagem com um dos poemas que constam do livro:




na sua voz, o que há de intratável

no gesto do corpo apanhado em ação e imobilizado

o curto fôlego das figuras

as palavras, nunca loucas, estão, no máximo, perversas

e, nas mais suaves, o sobressalto de um suspense



engendro monstros para não subestimar o poder do acaso

dissolvido, não sou recolhido em parte alguma

no ruído de um rasgão

o horror do estrago ainda mais forte do que a angústia da perda

plantado no lugar, sofro feito um pacote num canto esquecido da estação

falo pelo buraco na fechadura da linguagem

colho fungos na raiz do poema sequer dito

e minhas verdades não posso ler em qualquer recanto do corpo adverso

digo meu plural onde me ofereço em carinhos

mesmo quando nada tenho a dizer

ainda assim é a ti que digo nada

e te amo como se deve amar, em desespero, asfixiado de dor

num relâmpago frio

sequer o belo véu do silêncio

pode chorar todas as lágrimas do meu corpo



peço à pele que responda ao meu afeto

como se tivesse dedos na ponta de minhas palavras

cultivo esse roçar na escrita seca e obtusa

totalidade indelicada



o que me sufoca

inquietação que desgasta o ser

e no entanto não mata

porque não se morre de dor



escalpelado, sou poeta apenas quanto ao começo

faço luto à minha própria sinceridade

o corpo arrebenta em dizer quando calo minha voz

e escureço minha própria vista para não ser visto